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A NATUREZA DESTRUTIVA DA BRASKEM EM MACEIÓ

Professor da UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS (UFAL)

A NATUREZA DESTRUTIVA DA BRASKEM EM MACEIÓ

A Braskem resultou da formação da empresa Salgema Indústrias Químicas S/A, criada em 1968 e estatizada pelo BNDES em 1971, sob o controle da Petroquisa ‒ instalada em Alagoas entre 1974 e 1981 nos bairros do Pontal da Barra e do Trapiche da Barra (praia do Sobral). A cadeia produtiva da referida empresa deve-se à extração de sal-gema nas águas e manguezais da lagoa Mundaú e nos bairros do Pinheiro, Mutange, Bom Parto e Bebedouro, com a produção de cloro- soda e dicloretano no bairro do Pontal da Barra, e ainda com a produção de PVC na Planta instalada no Polo Industrial de Marechal Deodoro (AL).

A construção da fábrica de cloro-soda da Planta ou campo de salmoura e o terminal marítimo localizado na praia do Sobral começaram em 1974, expandindo seus tentáculos para as áreas de manguezais da lagoa Mundaú, de Marechal Deodoro e para a região urbana de Maceió (Mutange, Bebedouro e Pinheiro/Farol). A salmoura ou sal-gema serve de base à produção do cloro-soda, visando não somente à produção de PVC, mas de matéria-prima para a indústria de papel e celulose, química, petroquímica, metalurgia, construção civil, alimentos, bebidas, tratamento d’água, embalagem, produção têxtil e produtos transgênicos.

A unidade de Alagoas ocupa posição de destaque na produção de sal-gema devido às reservas encontradas nos bairros Mutange, Bebedouro, Pinheiro e Bom Parto, havendo ainda jazidas inertes com potencialidades para exploração na região do Tabuleiro dos Martins em Maceió e no litoral norte (Maceió, Paripueira e Barra de Santo Antônio). A Planta instalada em Alagoas somente se compara à existente no Polo de Camaçari na Bahia.

Imagem 1: Transferência de salmoura dos poços na região dos abalos sísmicos e rachaduras (Pinheiro, Mutange, Bebedouro e Bom Parto) para fábrica de cloro-soda da Braskem.

Fonte: ANM, 2019, p. 13.

A Salgema/Braskem instalou-se na região do Pontal da Barra e do Trapiche no fim da década de 1970, mediante um processo de expropriação do solo de milhares de trabalhadoras e trabalhadores artesanais, pescadores, marisqueiros etc. Inúmeras famílias foram desapropriadas e obrigadas a evacuar a região. O vazamento de gás com chamas de até 15 metros na unidade de dicloretano da Salgema, em março de 1982, intensificou o processo de expropriação dos imóveis dos moradores da região circunvizinha, intentando forjar um cinturão verde de proteção em torno da planta central da empresa em Alagoas (HISTÓRIA DE ALAGOAS, 2015, p. 1).

A implantação da Salgema (Braskem) numa região de elevada densidade populacional se constituiu como uma bomba pronta para explodir a qualquer momento, e não faltaram entidades, como o Movimento pela Vida, para denunciar a ameaça e o descaso do poder público e dos órgãos federais que autorizaram o funcionamento da referida unidade industrial. A ameaça ao meio ambiente e à segurança dos moradores não ficou circunscrita à sua planta central, mas estendeu-se para os bairros do Mutange, Bebedouro e Pinheiro, que dormiram durante 44 anos com cavernas e buracos sendo perfurados debaixo de seus pés. No entanto, os efeitos destrutivos dessa empresa não se limitam apenas ao seu período de implantação e desenvolvimento (1970-1990); eles retornaram com todo vigor na atualidade com abalos sísmicos, afundamento e rachaduras de milhares de edificações e de várias vias públicas nos bairros do Pinheiro, Mutange, Bebedouro e Bom Parto.

Imagem 2: Rachadura de prédio no Pinheiro/Maceió

Foto: Waldison Costa/G1, 2019.

O problema ganhou notoriedade depois das chuvas de fevereiro de 2018 e dos abalos sísmicos ocorridos em 3 de março de 2018. O tremor de terra (nos bairros do Pinheiro, Mutange, Bebedouro, Farol, Serraria, Jatiúca e Cruz das Almas), de magnitude 2,5 na Escala Richter, mostrou de maneira contundente a gravidade do problema.Imagem

3: Depressão semelhante a uma dolina numa via pública do Pinheiro/Maceió

Foto: Roberta Cólen/G1

A pressão e a organização popular culminaram na formação de um Grupo de Trabalho sobre Abalos Sísmicos em Maceió, formada por técnicos do Serviço Geológico Brasileiro, da Universidade Federal de Alagoas, da Defesa Civil Municipal, do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélite, do Instituto de Meio Ambiente de Alagoas e da Braskem. A responsabilidade pela investigação minuciosa das causas dos abalos sísmicos recaiu na comissão formada por cinquenta especialistas da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) do Serviço Geológico Brasileiro. O trabalho meticuloso de um ano e meio da referida comissão de trabalho resultou no relatório divulgado em 8 de maio de 2019 pela Agência Nacional de Mineração (ANM). A pesquisa científica utilizando equipamentos de elevada tecnologia responsabilizou a Braskem pelos abalos sísmicos e pelos danos causados aos milhares de moradores dos bairros mencionados e ao meio ambiente, particularmente à lagoa Mundaú.

A investigação não se restringiu a uma amostragem representativa do problema mediante análise e investigação de uma unidade, mas procurou detalhadamente averiguar o movimento interno de cada poço e de cada caverna, na perspectiva de alcançar uma conclusão irrefutável pela mineradora transnacional. Os especialistas recorreram ao modelo geológico 3D em todos os 62 poços existentes e num raio de perfuração de 52 mil metros de perfuração. O trabalho exaustivo requereu um levantamento topográfico e morfológico do subsolo, concluindo pela existência de zonas de falhas “na área de mineração de sal e em relação com a região de subsidência observada nos dados de interferometria” (CPRM, 2019, p. 16). O Serviço Geológico Brasileiro, através da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), “concluiu que os poços de mineração de sal-gema construídos pela Braskem ao longo de 44 anos causaram o afundamento registrado em três bairros de Maceió (AL), porque reativaram uma falha geológica adormecida há milhões de anos, às margens da lagoa Mundaú” (DIÁRIO DO PODER, 2019, p. 1).

Os técnicos da Braskem buscaram de todas as maneiras isentar a mineradora de responsabilidade pelos danos causados aos imóveis e aos moradores, lançando mão de uma plêiade de conjeturas em que recorriam à existência de problemas de depressão nas placas tectônicas, problemas dos serviços de drenagem e escoamento das águas das chuvas, depressões resultantes da existência de aquíferos, formação de bacias acumulativas de água no bairro do Pinheiro etc. Porém, o relatório da CPRM argumenta precisamente que:

É importante lembrar que foram levantadas nove causas a serem investigadas quando a sua possibilidade de representarem a causa-gatilho do fenômeno observado inicialmente no Pinheiro. Elas foram reunidas em quatro grupos. Dezenas de profissionais debruçaram-se na investigação de cada uma delas para avaliar a possibilidade que tinham de representar a causa- gatilho. Concluíram TODOS que os estudos apontam apenas a desestabilização das cavidades da extração de sal-gema como causa-gatilho. (CPRM, 2019, p.38)

A responsabilidade da Braskem pelo afundamento dos bairros de Maceió incontestável, resultante do processo irregular de extração do sal-gema. A extração de sal-gema (cloreto de sódio usado para fabricar soda cáustica PVC) realizadas de forma perdulária pela Braskem nos bairros do Mutange, Bebedouro e Pinheiro ao longo de quatro décadas culminou na desestabilização da estrutura das cavernas subterrâneas existentes e resultou em abalos sísmicos, instabilidades no solo, erosões, afundamento, fissuras, rupturas e rachaduras em milhares de edificações, vias e logradouros públicos.

Com base nos dados apresentados pela referida comissão, a Defesa Civil Municipal identificou a existência de três grandes fissuras, “cada uma com cerca de 1,5 km de extensão, afetando 2.480 moradias somente no Pinheiro” (GUSTAVO – RODRIGUES, 2019, p. 1).

 Imagem 4: Mapa de risco das regiões do Mutange, Bebedouro e Pinheiro

Imagem: Defesa Civil de Maceió, 2019.

No mapa acima, é possível observar os diferentes níveis de riscos de afundamento do solo e desabamento das moradias nos bairros de Mutange, Bebedouro e Pinheiro. O mapa divide as regiões afetadas em quatro cores (azul, verde, rosa, branca), subdivididas em azul-claro e azul- escuro, verde-claro e verde-escuro, rosa-claro e rosa-escuro. Pela mediação das cores busca-se mostrar que subsistem distinções dentro de uma mesma área, com algumas regiões revelando-se mais críticas do que outras.

        Áreas verde (“Setor 0; subdividido em 0.00 e 0.01) ou Zona de Cisalhamento: este setor abrange o maior quantum topográfico, sendo caracterizado pela Defesa Civil como Zona de “Cisalhamento”. Nessa região foram constatadas fraturamento, rachaduras e danos em edificações, vias públicas, redes elétricas e sistema de esgoto. A região é hegemonicamente ocupada pelo bairro do Pinheiro.

A “Zona de Cisalhamento” assume função hegemônica no mapa de risco, constituindo uma área crítica e com potencialidade de ampliação da erosão, havendo possibilidade de desestabilização e aprofundamento dos danos às moradias, prédios, vias públicas, redes elétricas, sistema de esgoto, água e gás. Demanda, portanto, um monitoramento permanente e a retirada dos moradores.

O bairro do Pinheiro possui dezenas de milhares de moradores; trata-se de um bairro que topograficamente se situa na parte alta de Maceió, tendo sua gênese histórica articulada ao bairro do Farol. Apesar de o poder público oferecer apoio à retirada de somente 500 famílias, 2 mil famílias evacuaram da região com receio duma tragédia. Uma observação in loco permite constatar inúmeras ruas isoladas, conjunto de prédios evacuados, escolas e hospitais fechados, postos de combustíveis isolados, casas abandonadas e atividades comerciais encerradas. As atividades persistem somente nas zonas em que as rachaduras se manifestam em pequenas proporções e ainda não representam uma ameaça visível à estrutura das edificações.

       Áreas rosa ou Zona de Movimento de Massa (Setor 1, subdividido em 1.00 e 1.01): esta zona é composta pelo bairro Mutange; é considerada pela Defesa Civil como “Zona de Movimento de Massa” (subdividido em 1.00, de cor rosa-claro, e 1.01, de rosa-escuro).

       A área em rosa-escuro ou “Setor 1.01” representa as regiões conhecidas como Gruta do Padre, no Mutange, e Cardoso, em Bebedouro. Essa zona é a área mais crítica (R3 e R4 CPRM), em que há maior possibilidade de incidência e afundamento do solo. Daí a necessidade da retirada dos moradores dessa zona com maior celeridade.

       Áreas azuis ou Zona de Alagamento (“Setor 2”, subdividida em 2.00 e 2.01, azul-claro e azul-escuro): a Defesa Civil considera esta zona como área de insalubridade e perda de funcionalidade das edificações. É subdividida em áreas de criticidade 00, identificadas pela cor azul-claro, que representa áreas já alagadas, e 01, azul-escuro, que aponta áreas passíveis de alagamento. A recomendação é para a retirada dos moradores do local, o isolamento e o monitoramento da região (TNH1, 2019, p. 1).

       Setor 3 ou Zona branca: Os círculos representam as minas de exploração de sal-gema realizadas pela Braskem no Mutange, Pinheiro, Bebedouro e na lagoa Mundaú, com consistente ameaça de dolinas. As estruturas circulares são hegemônicas na área do Mutange, na lagoa Mundaú e, em menor quantidade, no Pinheiro. São 31 estruturas circulares irregulares, resultantes das perfurações da Braskem, perfazendo quatro círculos no Pinheiro, oito na Lagoa Mundaú e 19 no Mutange.

O Mutange exerceu função elementar nas atividades exploratórias da mineradora transnacional. Observa-se a presença de inúmeras estruturas circulares, que revelam a existência de minas de exploração de sal-gema; caracteriza-se como zona de dolinas. As zonas brancas do setor 3 apresentam colapso em suas estruturas. A possibilidade de demolição e a abertura externa de suas crateras exigem uma remoção ainda mais célere de seus moradores.

A periculosidade envolvendo as áreas rosa, azul e os círculos no mapa acima exigiriam uma atuação mais consistente do poder público no sentido de garantir a segurança dos moradores e transeuntes das áreas mais críticas, devido à ação predatória e destrutiva da mencionada transnacional. O decreto de calamidade pública pela prefeitura municipal (março de 2019) foi reconhecido pelo governo federal, mas isso não implicou o efetivo atendimento aos moradores ameaçados pela tragédia de afundamento e rachaduras de suas residências nos quatro bairros de Maceió.

Visando evitar uma tragédia, como acima destacamos, a Defesa Civil operacionalizou a mudança de 500 famílias (junho de 2019) que tiveram suas residências afetadas pelas fortes rachaduras, afundamento e ameaças de desabamento no Pinheiro. Para isso foi liberado um auxílio- moradia do governo federal, a fim de colaborar no pagamento do aluguel da nova moradia, num período temporário de seis meses, no valor de mil reais para 500 famílias. Os recursos federais do Ministério de Desenvolvimento Regional (MGR) liberados para auxílio-moradia chegam a 11 milhões de reais.

No entanto, a Defesa Civil Municipal de Maceió e o governo estadual não puseram em andamento processo algum de apoio aos moradores dos demais bairros afetados. Cumpre notar que as famílias localizadas no Mutange sofrem ameaça similar aos atendidos no Pinheiro. As 400 famílias (cerca de 1.500 pessoas) cadastradas pela Defesa Civil Municipal do Mutange esperam pela efetivação do programa de evacuação desde junho de 2019. Cogitou-se a possibilidade de essas famílias serem realocados para imóveis do Programa da Caixa Econômica Federal “Minha Casa, Minha Vida”.

Na impossibilidade de assegurar sua isenção quanto aos danos causados aos moradores dos bairros acima mencionados, a Braskem foi obrigada a reconhecer sua responsabilidade após o laudo minucioso apresentado pelos técnicos e especialistas da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM). Só então a Braskem firmou, em 3 de janeiro de 2020, um “termo de acordo para apoio na desocupação das áreas de risco” no valor de 2,7 bilhões com a Procuradoria-Geral, o Ministério Público (Federal e Estadual), a Defensoria Pública (Federal e Estadual) e a Promotoria, sem a anuência dos moradores dos bairros afetados e de suas entidades representativas.

O “Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação” estabelecido no “Termo” de compromisso acrescenta o bairro do Bom Parto como área de risco e prevê a desocupação e a realocação de 62 imóveis, devendo participar de todo o processo 17 mil moradores e não 17 mil famílias ou imóveis. O Programa prevê ainda que “quando expirar o aluguel social pago pela União, o auxílio aluguel previsto no presente Termo será ofertado pela Braskem aos moradores para que se habilitem para fins de recebimento do auxílio aluguel, a fim de não haver descontinuidade do recebimento desses valores” (TERMO DO ACORDO QUE CELEBRAM AS PARTES, 2020, p. 2).

A realocação será realizada no prazo de dois anos, com o custo de 1,7 bilhão. Um bilhão deve ser utilizado no fechamento dos 35 poços existentes na região, ou seja, mais da metade dos recursos será destinada ao fechamento dos buracos cavados pelos capitalistas sedentos de riqueza. Parte expressiva dos recursos não tem como destinatários os moradores, que precisam de moradia e fazem jus a condições de vida digna.

Os recursos serão depositados paulatinamente ao longo dos dois anos, começando com uma “merreca” de 100 milhões de reais numa conta específica, para o início da aquisição dos imóveis situados nas áreas de risco. Os técnicos e peritos da Braskem vão conferir todos os imóveis com problemas estruturais listados no laudo técnico da Defesa Civil. O poder da Braskem não para na decisão final sobre os imóveis de risco “beneficiados”, mas revela-se especialmente na definição no valor dos imóveis, cabendo aos descontentes procurar a via jurídica, como consta no famigerado Termo: “em havendo discordância por parte de atingidos aos valores ofertados pela Braskem, fica facultada a propositura de medida judicial por qualquer das Partes, na qual a Braskem se obriga ao depósito do valor do laudo judicial de avaliação do imóvel…” (2020, p. 3).

Desse modo, as áreas desocupadas passaram à condição de propriedade privada da Braskem, que tomará as providências necessárias contra os possíveis invasores. A mineradora transnacional exercerá controle absoluto das áreas desocupadas mediante serviço permanente de vigilância. A natureza privatizante do acordo revela-se nos termos: “Os pagamentos referentes aos terrenos e edificações pressupõem a transferência do direito sobre o bem à Braskem, quando transferível” (2020, p. 6).

Observa-se que não se trata da liberação de 1,7 bilhão de reais para atender aos interesses das pessoas afetadas pela ação da multinacional, mas de um investimento financeiro mediante a aquisição de imóveis que foram desvalorizados pela empresa. O acordo claramente não atende aos interesses dos moradores, senão aos interesses espúrios da Braskem, que consegue não somente se isentar dos problemas decorrentes das desgraças cometidas, mas realiza um investimento bastante rentável na aquisição de imóveis. A desgraça da população atingida se traduz em investimento para a Braskem, que amplia seus bens de capitais por meio do termo assinado. E não é a primeira vez que a referida mineradora atua dessa maneira em Alagoas; é bom lembrar que ela iniciou expropriando compulsoriamente os moradores do Pontal da Barra e do Trapiche.

Na verdade, a Braskem não está perdendo nada, mas somente ganhando com o famigerado acordo. E como se não bastasse a acumulação de riqueza expressa na apropriação compulsória dos imóveis por valores estabelecidos unilateralmente pela mineradora, o Ministério Público e a Defensoria estabelecem que “não haverá requerimento de bloqueios judiciais, nas contas ou indisponibilidade de bens da Braskem nos autos dos processos […], ficando suspenso qualquer pedido formulado para esses fins” (2020, p. 9). As referidas entidades abrem mão tanto do bloqueio solicitado, de 2,7 bilhões de reais pelos danos causados ao meio ambiente e aos moradores dos bairros Pinheiro, Mutange e Bebedouro, como se dispõem a cancelar as ações na Justiça contra a Braskem, no valor de 6,7 bilhões de reais. Isso pode ser observado na cláusula que diz: “As Partes acordam que a celebração do presente Termo implica a extinção parcial da ação pública nº 0803836-61.2019.4.05.8000 em relação ao pagamentos por danos materiais e morais aos moradores pelos IMPACTOS PBM alcançados por este TERMO”. Os representantes do Ministério Público e da Defensoria abrem mão dos danos materiais e morais causados pela Braskem sem perguntar aos afetados se eles aceitam tamanha expropriação de seus direitos.

Parece óbvio que os representantes do poder público não representam os interesses da comunidade afetada. O termo assinado é, de fato, um estelionato aos direitos dos moradores; uma clara demonstração disso é que não possui a assinatura de nenhum representante dos bairros. O termo resulta de uma ação arbitrária e autoritária dos representantes da maquinaria estatal em conluio com os interesses da multinacional; a questão fundamental é o lucro da empresa e não o direito efetivo das pessoas afetadas. A decisão tomada arbitrariamente confirma a história da burguesia no Brasil, uma história em que as decisões fundamentais são tomadas pelo alto e à revelia dos trabalhadores. Uma história que culmina sempre na expropriação da riqueza de milhares de pessoas e de trabalhadores cujo único bem é a construção de sua moradia. Para não dizer que o “Termo” assinado não traz novidade, paradoxalmente reconhecemos que ele possui uma novidade: reconhecer que o problema afeta quatro bairros de Maceió, e não apenas três, como inicialmente. A novidade é que os problemas gerados pela Braskem podem ser bem maiores do que os anunciados até o momento.

Manter os interesses da Braskem em detrimento dos interesses das populações afetadas é a essência do sistema que se baseia no lucro e não nos interesses dos trabalhadores e da humanidade, pois a Braskem possui ações no mercado de futuro que precisam ser garantidas. Os interesses dos acionistas e do mercado financeiro estão acima dos interesses das famílias que se encontram desabrigadas e sobrevivendo numa área de risco. Assim, quando a Braskem apresenta o “Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação” ela não está pensando na ameaça que paira sobre os moradores, mas no próximo investimento que pode realizar. Ao comprar os imóveis dos moradores compulsoriamente por 1,7 bilhão de reais e gastar 1 bilhão de reais na preservação e manutenção de seus poços, a Braskem realiza um investimento em que seus negócios se valorizam no presente e tendem a se valorizar ainda mais no futuro, pois cada imóvel adquirido possui riquezas adormecidas em seu solo que não estão circunscritas ao sal-gema.

O périplo destrutivo da Braskem em Alagoas está muito longe de terminar. Após ter devastado o bairro do Pontal da Barra, os manguezais da lagoa Mundaú e parte do Trapiche da Barra nas décadas de 1970 e 1980, persiste como uma ameaça permanente de vazamento de gás e de gerar óbitos à população circunvizinha à sua Planta Industrial. A ação predatória da empresa em busca do lucro destruiu e destrói nos dias atuais quatro bairros de Maceió e parte da lagoa Mundaú, integrante do mais belo complexo lagunar existente no país. Não satisfeita, pretende agora expandir-se para o litoral norte (Maceió, Paripueira e Barra de Santo Antônio), na perspectiva de destruir os sistemas naturais existentes (restingas e manguezais), contaminar o solo e promover a retirada em massa dos moradores, como já fez no Trapiche da Barra e no Pontal da Barra.

Subsiste um conluio entre a maquinaria estatal e as transnacionais, em que os interesses em assegurar a preservação da taxa de lucro dos capitalistas e os interesses dos acionistas do mercado formado pelas mineradoras estão acima dos interesses das pessoas. Se depender do poder público, os interesses da Braskem serão preservados em detrimento dos interesses dos vitimizados, daí ser tarefa fundamental fortalecer a organização e a luta dos moradores do Pinheiro, Mutange, Bom Parto e Bebedouro.

Os interesses dos moradores dos bairros afetados somente serão garantidos com a organização e o enfrentamento ao sistema que continua se alimentando da rapinagem e do sequestro das riquezas da classe trabalhadora. A alternativa ao processo de destruição promovido pelas multinacionais como a Braskem deve partir da organização de trablhadoras e trabalhadores. É preciso organização para impedir que as multinacionais continuem a destruir a natureza, expropriando as riquezas da sociedade e intensificando a exploração da classe trabalhadora.

Por Artur Bispo

Referências

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TNH1. Prefeitura divulga mapa de danos no Pinheiro, Mutange e Bebedouro.Endereço eletrônico: https://www.tnh1.com.br/noticia/nid/prefeitura-divulga-mapa-de- danos-no-pinheiro-mutange-e-bebedouro/.

TNH1. Vídeo detalha zonas em mapa de danos do Pinheiro, Mutange e Bebedouro; assista. Endereço eletrônico: https://www.tnh1.com.br/noticia/nid/video-detalha-zonas-em- mapa-de-danos-do-pinheiro-mutange-e-bebedouro-assista.

TRIBUNA HOJE. Seis mil trabalhadores podem perder os empregos no Pinheiro. Endereço eletrônico: https://tribunahoje.com/noticias/economia/2019/08/31/seis-mil- trabalhadores-podem-perder-os-empregos-no-pinheiro/

Fonte: https://ofensivasocialista.wordpress.com/2020/04/13/a-natureza-destrutiva-da-braskem-em-maceio/

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